quarta-feira, 17 de junho de 2009

Iniciação esportiva.

Uma boa pedagogia não é aquela que demonstra um gesto para ser imitado, automatizado, mas é aquela que permite ao educando vivenciar um processo de ensino-aprendizagem
Falar sobre iniciação esportiva e iniciação ao futebol é a mesma coisa, pois tanto na forma quanto no conteúdo só me salta aos olhos as semelhanças, sendo que as teorias que sustentam minha afirmação me permitem desconsiderar as diferenças.

Sempre devemos pensar numa iniciação esportiva com foco nas semelhanças, na tese da família dos jogos, ou mesmo, na família dos jogos de bola, na família dos jogos de bola com os pés...

Quero ainda destacar que isso não impede ninguém de dizer escolinha de futebol, de basquete, de natação, mas pensar pedagogicamente numa escola de esporte.

As novas tendências em pedagogia do esporte apresentam inúmeros argumentos, teses e exemplos reforçando e sustentando um projeto de escola do esporte que tende ao “universal” (emprestando um termo cunhado por Benda e Pablo Juan Greco).

Contudo, antes de me ater e discorrer sobre a iniciação esportiva especificamente, insisto em um tema recorrente, chamando atenção à posição que muitas vezes se assume no tocante à iniciação esportiva, em que frequentemente a criança é subordinada à aprendizagem de estereótipos descritos em manuais técnicos, onde em suas “bulas” dizem alcançar resultados imediatos, porém os doutrinadores não se preocupam em determinar uma posologia para adequar à dosagem da “droga” (os graus de dificuldade) que será transmitido as crianças.

O professor João Paulo Medina foi muito feliz na sua reflexão sobre esse fato, dizendo que, como resultado dessa produção, pois não podemos chamar de construção, produz-se às vezes atletas espetaculares, mas não se dão conta do processo de desumanização que envolve os rituais para a sua produção.

É esta estereotipação de gestos técnicos aliada à automação de movimentos que devem dar lugar a uma pedagogia de esporte que humanize todo o processo; que não se preocupe apenas em produzir um atleta, mas sim em primeiro lugar forme o homem (sem reproduzir chavão, cair na retórica do esporte como panacéia, ou lugar-comum), que virá a ser o atleta do futuro, mais completo e seguro das suas possibilidades.

Uma boa pedagogia não é aquela que demonstra um gesto para ser imitado, automatizado, mas é aquela que permite ao educando vivenciar um processo de ensino-aprendizagem, onde, por meio da possibilidade de exploração, a criança descobre o seu gesto eficaz, o qual representa os seus possíveis.

Segundo o professor Incarbone (em um artigo do início da década de noventa): “O professor deve ter muito em conta que não deve modelar o menino à semelhança de ..., e sim ele deve dar uma grande bagagem de experiências motoras contribuindo para o armazenamento de seu acervo motor, o qual permita desenvolver-se no futuro com grande variedade de habilidades motoras, que não só apontariam para um esporte, mas também à sua vida diária.”

Novamente, sabiamente Medina complementa, afirmando que não é fácil formar homens quando o sistema pede robôs. Não é fácil desenvolver atletas cidadãos, críticos, conscientes, educados e criativos, quando o sistema pede apenas “máquinas” obedientes e automaticamente descartáveis, quando deixam de produzir o rendimento esperado.

Entretanto, longe de uma especialização precoce, o esporte deve permitir à criança iniciante a obtenção de uma boa cultura motora em meio a uma variedade de práticas corporais.

E proporcionando ao jovem uma aprendizagem sobre jogos adequada, estar-se-á tornando a prática esportiva alargada a todos e para sempre.

Gustavo Pires, em seu livro “O desporto no século XXI: os novos desafios”, corrobora e complementa, dizendo que o esporte visto como um meio educativo e um instrumento pedagógico, deve assumir características de complemento curricular à formação da criança, pois assim entendido, possibilita ao aluno o extravaso de suas necessidades, desejos e interesses envoltos num regime de liberdade de participação e escolha voluntária.

Portanto, se levados em consideração essas ponderações preliminares, estar-se-á garantindo o desenvolvimento de um trabalho que, longe de ser especialização precoce, proporcionará um desenvolvimento harmônico e global para as crianças que buscam sua iniciação esportiva, carregada de sonhos e desejos (nunca enganadas, iludidas ou mesmo, usadas).